EHS: Técnicas para a evolução

TÉCNICAS PARA A EVOLUÇÃO

Amanhecia, lucidamente, em mim,
mas recusavam.me, terminantemente, o Sol.

Então quis anoitecer,
quando uma simples miragem solar
voltava para simular claridade.

E, assim, não pude sentir-me
nem claridade
nem sombra.

Quis amar flores, astros
e, principalmente, pessoas!
Mas ofereceram-me diferenças, sangue
e, especialmente, máquinas…

E tudo isso me fez paradoxal.

Pois, hoje, as máquinas produzem,
de forma científica e fria,
flores, astros, pessoas, diferenças,
e sangue e novas máquinas!

Hoje as máquinas falam,
discursam e até gritam.

E os homens?

Os homens guincham
e trituram, sem parar,
seu coração-engrenagem…

E agora as máquinas já alardeiam
seu mais recente e espantoso progresso:
elas já desenvolveram condições e técnicas
para a produção de poesia!

No meu lúcido-doido raciocínio,
Sinto que os homens emudeceram sua seiva,
como plantas interditadas à vista solar,
como peças ainda úteis numa oficina fechada.

Só de quando em quando, os homens
(que assumiram aspecto e brilho metálicos)
gemem, soluçam (mas mecanicamente!),
buscando uma ilusória produção em série
de qualquer sonho enferrujado.

E vamos todos,
em disciplinadas filas,
autômatos de olhos cinzentos,
incapazes de refletirmos um raio de sol,
cantando nosso novo hino de louvor…

Brum, step!
Brum, step!
Pá, plim, tuf!

poema inédito, de meados dos anos 80,
escrito por Ernesto Henriques da Silva (1948-1989)

in À Solar Idade – 1983-88

http://lodoludicoliberdade.blogspot.de/2012/10/tecnicas-para-evolucao.html

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